Disciplina - Lingua Portuguesa

Português

01/04/2009

Sem medo da folha em branco

O bicho-papão que aterrorizou muita gente até os anos 1990 não existe mais. Ao invés de aulas de redação, que cobravam mais ortografia e gramática do que coesão e coerência, os alunos de hoje aprendem a produção textual de uma forma mais abrangente
Juliana Vines
Introdução, exposição de argumentos e conclusão. Tudo isso em cinco parágrafos, 30 linhas no máximo. A fórmula quase matemática de escrever limitava as possibilidades textuais e deixava a atividade ainda mais difícil.
Essa era a redação cobrada até dez anos atrás. Isso mesmo, era.“É uma ideia superada do ponto de vista da linguística. Existem os gêneros, mas há uma flexibilidade. A escola não pode estabelecer características rígidas, como se fosse uma receita de bolo”, comenta Ângela Mari Gusso, professora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e pesquisadora da área.
Ler para escrever melhor
Essencial para produzir bons textos, aprender a interpretar e entender as formas discursivas são processos que acontecem juntamente com a prática da escrita. “A redação e a interpretação devem estar juntas. O aluno não se prepara bem para a escrita se não ler, não enriquecer seu vocabulário, e, se não entender o que os outros textos estão dizendo”, explica Maria Iolanda, coodenadora do curso de Pedagogia da Universidade Tuitui do Paraná.
Para que a habilidade de compreensão seja desenvolvida é necessário o contato com diferentes formas de discurso. “As cartilhas trabalhavam com frases soltas. Ninguém aprende a construir e a entender sentidos com frases sem significado. Isso é o que acontecia até um tempo e as estatísticas mostram que uma grande parcela da população letrada ainda não compreende o que lê. Se com leitura estamos nesses níveis, imagine como estamos em relação à escrita?”, questiona Ângela Mari Gusso, professora da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e pesquisadora da área.
Existem mais de quatro mil gêneros textuais, não apenas a narração, dissertação e descrição. Editoriais, cartazes, outdoors, placas, e-mails, jornais, comunicados, recibos e até bulas de remédio. Tudo isso é texto e faz parte da vida dos alunos desde o momento em que eles aprendem a ler. E todos eles devem ser apresentados no momento da alfabetização. “Os alunos precisam aprender paralelamente o sistema de escrita, a função e os gêneros textuais”, complementa Ângela.
Essa é a diferença do novo conceito de produção textual para o antigo, de redação. A nova escrita remete a um trabalho de identificação e produção de gêneros levando em conta não só a estrutura do texto, mas também a condição social em que o discurso está inserido. Quem está escrevendo, para quem e onde será veiculado? “O aluno precisa saber o porquê da atividade. Era comum esses textos serem solicitados sem muita conversa prévia. A escrita representava apenas a aplicação do conhecimento apreendido nas aulas de gramática”, diz Maria Iolanda Fontana, coodenadora do curso de Pedagogia da Universidade Tuitui do Paraná.
Escrita viva
Fazer um texto apenas para o professor ler e corrigir é a chamada escrita artificial, o contrário da escrita viva, quando os alunos trabalham com temas mais próximos das suas realidades e produzem com uma finalidade maior do que simplesmente ganhar uma nota no fim do bimestre. “O professor deve fazer com que esse texto chegue a outros possíveis leitores. Isso dá uma motivação maior e comprometimento com a escrita. Um cartaz pode ser colocado em um local visível fora da escola”, exemplifica Ângela.
Além de ter leitores reais, a proposta da escrita viva faz com que os alunos não se sintam limitados quanto a forma. A professora de Língua Portuguesa do ensino fundamental da escola Terra Firme, Sandra Mari Franz, conta que os temas abordados nas aulas de produção de texto são definidos pelos próprios alunos. São eles também que escolhem qual produto que-rem fazer. “Quanto maior a quantidade de gêneros textuais, mais se amplia a capacidade linguística da criança e ficam mais claras as preferências de cada um. Alguns têm facilidade com textos argumentativos, outros, que desenham bem, preferem fazer cartuns”, comenta Sandra.
Essa liberdade na produção de textos atual não significa que deixam de existir correções, nem tampouco cobranças. Apesar de a redação cheia de regrinhas ter desaparecido, as aulas ainda cobram a prática, as regras gramaticais e a reescrita. “O aluno precisa produzir intensamente e reescrever. A reescrita faz parte do processo de aprendizagem. O professor deve avaliar os problemas que o texto apresenta e junto com o aluno procurar as alternativas”, diz Ângela.

Fonte: http://portal.rpc.com.br/gazetadopovo/
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